Carlos Drummond de Andrade
100 anos: 1902-2002
Fernando Pessoa, por
Almada Negreiros
Ao lado, dois poemas de Drummond que estabelecem um
diálogo explícito com o poeta português Fernando Pessoa (1888-1935). O
"Sonetilho do Falso Fernando Pessoa" veio a público em 1951. Nele, Drummond
tenta escrever com "astúcias" e "fingimentos" típicos de Pessoa. Já em
"As Identidades do Poeta" ― que está em
Farewell, livro póstumo lançado em 1996 ―, o mestre
itabirano tenta desvendar (mas no final desiste) o mistério dos múltiplos
poetas residentes em "Fernando Reis de Campos Caeiro Pessoa".
Mais Fernando Pessoa
neste
endereço.
DRUMMOND FADISTA
O jornalista Bias Arrudão, que acompanha bem a evolução da moderna música
portuguesa, chama a atenção para outra aproximação de Drummond com artistas
lusos. Ele informa: a cantora e compositora Amélia Muge musicou o poema
"Ainda que mal" (boletim n. 31),
que se tornou a letra do fado "Ainda que". A canção foi gravada no CD
Paixões Diagonais, da fadista Mísia, lançado no Brasil pela Warner em
1999. Aparentemente, esse disco está fora de catálogo.
Ouça o fado "Ainda que". Basta
clicar aqui.
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SONETILHO DO FALSO FERNANDO
PESSOA
Onde nasci, morri.
Onde morri, existo.
E das peles que visto
muitas há que não vi.
Sem mim como sem ti
posso durar. Desisto
de tudo quanto é misto
e que odiei ou senti.
Nem Fausto nem Mefisto,
à deusa que se ri
deste nosso oaristo,
eis-me a dizer: assisto
além, nenhum, aqui,
mas não sou eu, nem isto.
Carlos Drummond de
Andrade
In Claro Enigma
José Olympio, 1951
© Graña Drummond
AS IDENTIDADES DO POETA
(trecho)
(...)
Fernando Pessoa caminha sozinho
pelas ruas da Baixa,
pela rotina do escritório
mercantil hostil
ou vai, dialogante, em companhia
de tantos si-mesmos
que mal pressentimos
na seca solitude
de seu sobretudo?
Afinal, quem é quem, na maranha
de fingimento que mal finge
e vai tecendo com fios de astúcia
personas mil na vaga estrutura
de um frágil Pessoa?
(...)
Carlos Drummond de
Andrade
In Farewell
Record, 1996
© Graña Drummond
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