Número 81

São Paulo, quarta-feira, 11 de agosto de 2004 

«O paraíso sempre foi perdido.» (Roberval Pereyr)
 


Sylvia Plath


Caros,

Como ocorre freqüentemente com artistas, o trabalho da poeta americana Sylvia Plath (1932-1963) só se tornou conhecido após sua morte. Sylvia suicidou-se, depois de abandonada pelo marido, o também poeta Ted Hughes. Muitos apontaram Hughes como o principal motivo do suicídio da ex-esposa. O certo é que Sylvia era uma alma atormentada e já havia feito três tentativas de suicídio antes da separação. A história tornou-se até roteiro de cinema, para o filme Sylvia (2003), dirigido por Christine Jeffs, com Gwyneth Paltrow e Daniel Craig, nos papéis da personagem-título e do marido.

O primeiro livro de Sylvia Plath foi publicado em 1960. Era a coletânea The Colossus. Nessa obra, o talento dela já se mostrava, mas a autora ainda estava amarrada a padrões convencionais. Somente nos poemas  póstumos — Ariel (1965); Crossing The Water (1971); Winter Trees (1972); e The Collected Poems (1981) — é que se revelaram sua criatividade, técnica e força emocional.

A riqueza da poesia de Sylvia, combinada com as circunstâncias trágicas de sua morte, transformou a escritora num verdadeiro ícone de admiração internacional. Se você for hoje ao Google e digitar o nome dela, vai encontrar nada menos que 144.000 referências [1.190.000 em agosto/2014].

Trata-se de um resultado incrível para um poeta. Apenas a título de comparação: as referências ao roqueiro Mick Jagger, ligado à indústria do entretenimento há mais de 40 anos, não são terrivelmente superiores, como se poderia esperar: 251.000 [6.210.000 em agosto/2014].

Sylvia também escreveu ficção e alguns de seus livros nesse gênero estão disponíveis no Brasil. O único de poesia é uma coletânea bilíngüe, traduzida por Rodrigo Garcia Lopes e Maurício Arruda Mendonça (Poemas, Ed. Iluminuras, 1994).

Para ter acesso à poesia de Sylvia Plath no original, visite o site Sylvia Plath Page.


Um abraço, e até a próxima.

Carlos Machado


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Veja mais sobre Sylvia Plath no boletim n. 237.

 

O olho de um pequeno deus

Sylvia Plath

 

 

ESPELHO

       Tradução: Rodrigo Garcia Lopes e Maurício A. Mendonça

Sou prateado e exato. Não tenho preconceitos.
Tudo o que vejo engulo no mesmo momento
Do jeito que é, sem manchas de amor ou desprezo.
Não sou cruel, apenas verdadeiro —
O olho de um pequeno deus, com quatro cantos.
O tempo todo medito do outro lado da parede.
Cor-de-rosa, malhada. Há tanto tempo olho para ele
Que acho que faz parte do meu coração. Mas ele
                                                   [ falha.
Escuridão e faces nos separam mais e mais.

        
Sou um lago, agora. Uma mulher se debruça
                                                   [ sobre mim,
Buscando em minhas margens sua imagem
                                                   [ verdadeira.
Então olha aquelas mentirosas, as velas ou a lua.
Vejo suas costas, e a reflito fielmente.
Me retribui com lágrimas e acenos.
Sou importante para ela. Ela vai e vem.
A cada manhã seu rosto repõe a escuridão.
Ela afogou uma menina em mim, e em mim uma velha
Emerge em sua direção, dia a dia, como um
                                                   [ peixe terrível.

 


Velásquez - Vênus ao Espelho (1647)
Diego Velásquez, Vênus ao Espelho (1647)




MIRROR


I am silver and exact. I have no preconceptions.
Whatever I see, I swallow immediately.
Just as it is, unmisted by love or dislike
I am not cruel, only truthful

The eye of a little god, four-cornered.
Most of the time I meditate on the opposite wall.
It is pink, with speckles. I have looked at it so long
I think it is a part of my heart. But it flickers.
Faces and darkness separate us over and over.

Now I am a lake. A woman bends over me.
Searching my reaches for what she really is.
Then she turns to those liars, the candles or the
                                                [ moon.
I see her back, and reflect it faithfully
She rewards me with tears and an agitation of hands.
I am important to her. She comes and goes.
Each morning it is her face that replaces the
                                               [ darkness.
In me she has drowned a young girl, and in me an old
                                               [ woman
Rises toward her day after day, like a terrible fish.

 

poesia.net
www.algumapoesia.com.br
Carlos Machado, 2004

Poema extraído de:
•  Sylvia Plath
    Poemas
   
Tradução de Rodrigo Garcia Lopes e
    Maurício Arruda Mendonça
   
Ed. Iluminuras, 2a. ed., São Paulo, 1994