Trazíbulo Casas
Caros,
Nascido em Feira de Santana - BA, na safra de 1957, Trazíbulo Henrique Pardo
Casas equilibra-se bem entre a matemática, de que é professor, e a poesia, à
qual oferece dedicação diferenciada e apoio integral. Ativista literário,
participou das revistas Atos e Salamandra, ambas de poesia, e O
Lixo, de contos. É também co-diretor da revista Hera, a mais longeva
publicação de poesia no Brasil, desde 1985. Além de textos avulsos em revistas,
Trazíbulo Casas publicou dois livros de poesia: Explicações à Minha Bota
Furada
(1983) e Noite Verde (2000).
A poesia de Trazíbulo é uma constante tentativa de
flagrar, com certa perplexidade, momentos de alta voltagem poética que brotam em
cenas banais do cotidiano. Com algumas pitadas de surrealismo, ele cria um clima
lírico estranho, mas que ao mesmo tempo nunca se afasta de referências bem
conhecidas. Leia-se, por exemplo, o poema "Canção de Rádio": "A coragem
passeia na madrugada / casas olham, cúmplices / camas voam". Em "Prólogo",
alguns homens decidem o destino do mundo enquanto um louco sonha com Homero.
É como se sempre houvesse uma superposição do mundo prosaico das decisões de
poder com outra dimensão, mais profunda e onírica, por onde perpassam Homero, o
homem de Neandertal (em "Arcturus") e a lua (em "O Beijo"). Uma convivência do
efêmero com algo mais histórico ou talvez permanente.
No poema "Correspondente de Guerra" nota-se uma interpenetração das preocupações
matemáticas do autor ("cortei os cabelos / e nada de resolver aquelas equações")
com o noticiário de mais um conflito armado. A guerra invade o ambiente
familiar, simbolizada pela imagem da correspondente de guerra Christiane
Amanpour, jornalista da rede americana CNN. Na guerra transformada em
espetáculo, "a noite é verde".
No poema "Concerto para Flauta Doce e Tímpanos Roxos", o poeta emprega a mesma
técnica de combinar reflexões pessoais com o transporte coletivo, a opinião
pública e até com a morte, que "brinca de aparecer / em fotografias /
quotidianas". Aqui, o contraste se dá entre o que pensa o indivíduo e o
espetáculo diverso que a realidade insiste em lhe mostrar.
Em "Noturno dos Viajantes" e "My Happy Days in New York", o tom é diferente. Num
misto de desencantamento e nostalgia, no primeiro apresenta-se uma constatação
existencial, que pode ser, mais uma vez, uma referência à morte. No outro,
predomina certa ironia, mostrada desde o título, em inglês, que parece lembrar
indefinidos dias felizes na cidade de Nova York. O que dá o tom dessas supostas
lembranças são contas (dinheiro) e a esperança de encontrar a felicidade "nas
gôndolas / ou coisa parecida". Seriam as gôndolas de um supermercado ou loja
similar?
Um abraço, e até a próxima.
Carlos Machado
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poesia.net em números
Em agosto, o site
Alguma Poesia, que abriga as páginas deste boletim, bateu mais um recorde de
audiência. Registrou, um total de 17 mil visitantes, o equivalente à média de
550 visitas diárias.
Nova revista, Litbr.com
Quero registrar o surgimento de uma nova revista online de literatura. Trata-se
da Litbr.com, um jeito breve de dizer literatura brasileira. Variada, a
publicação traz ensaios, contos, poesia e entrevistas. Dirigida por Fernando
Kraichete, a Litbr é mensal e já está no número 3. No número 2, fui convidado a
participar, falando exatamente do poesia.net. |
A noite é verde
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Trazíbulo Casas |
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PRÓLOGO
p/ fernando hora
todas as noites
aqueles homens decidem o destino
do mundo.
fora de cena, um louco enrola-se
em jornais
e sonha com homero.
CANÇÃO
DE RÁDIO
a coragem passeia na madrugada
casas olham, cúmplices
camas voam
filho, distante
continuo ouvindo bach
)o que deus fez está bem feito(
a coragem passeia na madrugada
e assobiando compõe
com um violoncelo sem alma
PASSEANDO EM ARCTURUS
estou além daquele lago.
e mostro meu último poema
ao homem de neanderthal.
O BEIJO
as normalistas noturnas vão para casa
quase sempre não percebem a lua
que conversa comigo
pela vidraça quebrada do banheiro
CORRESPONDENTE DE GUERRA
ainda ontem cortei os cabelos
e nada de resolver aquelas equações —
a noite
narrada por christiane amanpour
farei caminhadas
e continuo lendo os russos —
a noite é
narrada por christiane amanpour
meu filho avisa
não são jogos de guerra na tv
a noite é verde
narrada por christiane amanpour
CONCERTO PARA FLAUTA DOCE
E TÍMPANOS ROXOS
esta manhã, esta solidão
são pedaços de películas cinematográficas
páginas de romance
a vida é uma catarse
no transporte coletivo cheio de opinião pública
saudade, amada
apenas notas de canções
marcações coreográficas
enquanto as
classes se debatem
e continuo preso à sonoridade
da equação
:1 casaco vale 20 varas de linho:
beijo apaixonado
é coisa de normalista
a morte no entanto brinca de aparecer
em fotografias
quotidianas
mas que diabo
não paro de pensar naquela mulher
NOTURNO DOS VIAJANTES
depois de uma longa conversa
todos os corpos se vão.
numa balouçante barca
sem cor.
MY HAPPY DAYS IN NEW YORK
as janelas olham
uma estudante às vésperas
do exame
uma mesa posta
um casal e as contas
as janelas sentem
um violoncelo soluçante
uma estante vazia
quem sabe
hoje encontro a felicidade
nas gôndolas
ou coisa parecida
as janelas
e um letreiro de academia de ioga
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