Amigas e amigos,
O poesia.net também tem, digamos, suas idiossincrasias. Ou, se quiserem, suas prescrições e manias. Uma delas, assumida nos últimos anos, é tentar equilibrar a presença de poetas homens e mulheres nos boletins. Apesar disso, como se sabe, esse preceito nem sempre é cumprido com êxito. Este ano começamos bem: nas cinco primeiras edições havia quatro mulheres. Nas seguintes, contudo, o primado das poetas
ruiu fragorosamente.
Este boletim é uma tentativa de reduzir o desequilíbrio. Para isso, recorri ao acervo do poesia.net e de lá extraí nove poemas de nove mulheres
contemporâneas, todos eles tratando de algum aspecto da vida feminina.
As nove autoras são: Raiça Bonfim; Sônia Barros; Dalila Teles Veras; Adriane Garcia; Vera Lúcia de Oliveira; Quinita Ribeiro Sampaio; Líria Porto; Marize Castro; e Adélia Prado. O critério de seleção foi
a autora já ter publicado aqui no poesia.net algum poema dando notícia da condição feminina.
Os textos das poetas são apresentados na ordem em que apareceram no boletim.
Como sempre faço nessas “antologias”, não usei nenhum poema publicado no ano corrente.
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Como diz a poeta baiana Myriam Fraga (1937-2016), “Poesia é coisa / De mulheres. / Um serviço usual, / Reacender de fogos” (o poema inteiro, “Ars Poetica”, está aqui). De fato, ninguém melhor do que as mulheres para acender e reacender as fogueiras da vida. Usei esses versos de Myriam Fraga também como epígrafe deste boletim.
Mas vamos
aos poemas. Para facilitar a identificação de onde eles vieram, coloquei, nos
comentários, o número do boletim logo abaixo do nome da autora.
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Raíça Bomfim
poesia.net n. 226
Atriz profissional e estudiosa do teatro, Raíça Bomfim (Vitória da Conquista-BA, 1986) é uma
artista que se divide entre o palco e a criação poética. No poema "Sinuosidades", ela
desenvolve um texto de autoafinação e afirmação feminina diante de um parceiro que parece
excessivamente tímido e cauteloso. O texto, no qual fala uma jovem, é decidido e
provocante desde o início: "quando vi sua hesitação, eu já sabia / é que tenho
jeito de moça pura / e cara de mulher vadia".
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Sônia Barros
poesia.net n. 327
Nome respeitado na literatura infantil,
a poeta Sônia Barros (Monte Mor-SP, 1968) preocupa-se, no poema “Futuro”, com o destino de uma menina que busca matar a fome catando lixo. Lamentavelmente,
cenas como esta — que supúnhamos já relegadas ao passado — voltam agora ao nosso
país com toda a sua brutalidade
e injustiça. A pessoa que assiste à cena conclui que o futuro espia aquela menina faminta "com
garras / e agulhas / sem linha". Triste.
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Dalila Teles Veras
poesia.net n. 331
Portuguesa e muito brasileira, Dalila Teles Veras (Ilha da Madeira, 1946) dirige seu olhar sensível
para o trabalho de mulheres pobres. “As Faxineiras do Edifício” é um poema antológico. Apesar da jornada
estafante, aquelas trabalhadoras ainda encontram motivo para cantar.
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Adriane Garcia
poesia.net n. 334
Sônia Barros olhou para a menina abandonada. Dalila Teles Veras observou as faxineiras dos prédios urbanos.
A mineira Adriane Garcia (Belo Horizonte, 1973) voltou-se para as mães que protegem os filhos
adormecidos no colo: “Pietás de carne e osso / Carregando destinos”, escreve a poeta.
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Vera Lúcia de Oliveira
poesia.net n. 341
A mulher retratada por Vera Lúcia de Oliveira (Cândido Mendes-SP, 1957) no poema “Para Dentro”
encontra-se, possivelmente, num momento de angústia e autorreflexão. Sente-se “como águas que jorram /
para dentro” e identifica a aquisição de hábitos como girar em volta dos próprios passos e “revolver
os ossos”. Quer dizer, retornar a coisas passadas e já definitivamente perdidas.
[Atenção: este poema de Vera Lúcia foi publicado aqui no poesia.net, não
no boletim, mas como um cartão poético no Facebook. O boletim indicado acima
mostra outros poemas do mesmo livro.]
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Quinita Ribeiro Sampaio
poesia.net n. 344
A poeta Quinita Sampaio (Campinas-SP, 1926) faz, no poema “Retrato”, uma bela reflexão
diante da foto daquela menina que foi um dia. “Já habitei sua pele / mas dela nada mais sei / não conheço
a menina do retrato”, escreve a poeta. Mais adiante, pateticamente, ela pergunta em que dia terá
morrido aquela menina.
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Líria Porto
poesia.net n. 350
Talvez todas as mulheres e meninas citadas até aqui nos poemas sejam criaturas de cidades grandes.
Mas a mulher que aparece no poema “Irreconhecível”, de Líria Porto (Araguari-MG, 1945), é uma criatura
do interior. Canoeira, ela passa por baixo do arco-íris e se converte em homem. Contudo, essa
transformação de gênero tem um objetivo bem banal, porém enorme para uma mulher submetida ao
patriarcado nas lonjuras deste país. Na condição de homem, ela “bebia com os pescadores / contava vantagem”
— atividades exclusivas dos varões sertanejos.
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Marize Castro
poesia.net n. 365
No poema “Néctar” a poeta potiguar Marize Castro (Natal-RN, 1962) fala da condição feminina partindo de histórias trágicas
envolvendo mulheres da literatura. Ela não faz citações claras, mas possivelmente se refere à poeta americana Sylvia Plath
(“aquela que abre o gás”) e à inglesa Virginia Woolf (“a loba que entra no rio / com os bolsos cheios de pedras”).
De forma desconcertante, a mulher que fala no poema diz que não é nenhuma dessas: “Sou todas elas”.
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Adélia Prado
poesia.net n. 368
No poema “Neurolinguística”, Adélia Prado (Divinópolis-MG, 1935) cede a palavra a uma
viúva sexagenária que experimenta ímpetos juvenis após o galanteio de um admirador.
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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LANÇAMENTOS
Nova coletânea de poemas, no Rio de Janeiro e em São Paulo, e uma exposição de
pinturas em Salvador.
Antologia Poetrix 5
• Goulart Gomes (org.)
O poeta baiano Goulart Gomes (org.) lança a obra coletiva
Antologia Poetrix 5. Poetrix, para quem não sabe, é um poemeto de três versos,
estrutura criada por Goulart Gomes e adotada por muitos poetas, como prova a
antologia. São dois lançamentos.
NO RIO DE JANEIRO
Quando:
Sexta-feira, 11/08/2017,
das 18h às 21h
Onde:
Livraria Cultura
Rua Senador Dantas, 45 - mezanino - Centro
Rio de Janeiro, RJ
EM SÃO PAULO
Quando:
Sábado, 12/08/2017,
das 17h30 às 20h30
Onde:
Espaço Scortecci
Rua Deputado Lacerda Franco, 96 - Pinheiros
São Paulo, SP
Crônica Sertaneja
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exposição
• Juraci Dórea, pintor
Está em curso
a exposição "Crônica Sertaneja", do pintor Juraci Dórea. Com essa mostra, o Museu de Arte da Bahia,
fundado em 1918, dá início às comemorações de seus 100 anos de existência.
Quando:
De 26 de julho a
10 de setembro
Horários:
De terça a sexta-feira, das 13 às 19 horas;
sábados, domingos e feriados, das 14 às 19 horas
Onde:
Museu de Arte da Bahia
Av. Sete de Setembro, 2340 - Vitória
Salvador, BA
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