Amigas e amigos,
Nesta edição, o poesia.net traz a esta página pela terceira vez o jornalista, professor e poeta baiano
Florisvaldo Mattos. Este autor já esteve aqui nas edições n. 85 e n. 281.
O retorno do poeta ao boletim se justifica por pelo menos dois motivos fortes. O primeiro é o recente lançamento de
sua Antologia Poética e Inéditos (2017). O outro, uma efeméride pessoal: o poeta, nesta semana, completa bem vividos 86 anos.
No segundo boletim dedicado ao poeta, assim caracterizei sua
obra: “Praticante de um lirismo marcado por influências clássicas,
Florisvaldo Mattos cultiva o gosto pelo verso medido — especialmente o
decassílabo — e exibe em seu acervo um bom punhado de sonetos primorosos”.
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Nesta edição destaquei aspectos líricos diferentes dos abordados nas duas anteriores.
Por isso, se você quiser conhecer outras facetas dos escritos de Florisvaldo
Mattos, convido a amiga leitora, o amigo leitor a visitar os outros dois boletins dedicados
ao poeta:
n. 85
e n. 281
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Para este boletim, escolhi um punhado de poemas da recente Antologia. Para começar, o soneto “Dias de 1942 (na mata)”,
no qual o poeta registra como recebia, pelo rádio, no interior da Bahia, aos 10 anos de idade, as notícias da Segunda Grande
Guerra, na Europa. Há soldados, tanques e combates na Bavária, mas ali perto, à luz dos vaga-lumes, “o silêncio da mata (...)
/ amortece o eco das calamidades”.
O poema seguinte é outro soneto, também ambientado em Água Preta, atual Uruçuca, terra natal do autor. O poeta, neste
texto,
parece relembrar o momento em que teve de abandonar o ninho para ir estudar em
cidade maior. “Na Rua do Apertucho,
com tristeza, /
me despeço de mim, dos meus amigos.”
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Nas quadras de “Duas Almas”, Florisvaldo Mattos traça paralelos entre a vida e a obra de dois grandes poetas do século XX:
o grego Konstantinos Kaváfis (1863-1933)
e o britânico W.H. Auden (1907-1973).
O poeta baiano considera as “maldições e hipocrisias” que os dois bardos de além-mar sofreram pelo fato de serem homossexuais.
“Irmãos de alma e desejo interditado. / A sombra de ambos pelos portos vaga. / Adentra alcovas cujos balcões se abrem /
para oásis de prazeres e jardins.”
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Encerro esta pequena antologia com o texto “A Edição Matutina”, dedicado ao cineasta Glauber Rocha (1939-1981), seu amigo e
colega de jornalismo. Publicado originalmente no livro A Caligrafia do Soluço (1996), trata-se de uma ode longa, que
se estende por cinco páginas. Transcrevo aqui apenas dois trechos, correspondentes ao início e ao fim do poema.
Não tenho ideia de quando o poeta escreveu essa ode em homenagem ao amigo. Suponho, no entanto, que deve ter sido escrita sob
o impacto da morte do cineasta e ex-colega, ainda no período da ditadura militar. “Nada sei além do que me contam /
os hebdomadários perseguidos / os diários desaparecidos / os livros burocraticamente censurados / os discursos jamais pronunciados”.
O segundo trecho transcrito faz explícita referência à morte do cineasta. “Morreu o Chefe de Reportagem / E ficamos todos tristes”.
Neste poema, "A Edição Matutina", Florisvaldo Mattos combina com maestria a tristeza pela perda do amigo e destacado inovador da
sétima arte, sua experiência de jornalista e o ambiente sufocante marcado pela censura à imprensa e às artes, tudo isso em meio
às perseguições, prisões e assassinatos de opositores políticos.
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Natural de Uruçuca, no sul baiano, Florisvaldo Mattos (1932-) formou-se em direito na Universidade Federal da Bahia, mas optou
pelo jornalismo. Nos anos 60, fez parte do grupo nuclear da chamada Geração Mapa,
artistas que se reuniam em torno da revista Mapa, sob a liderança do cineasta Glauber Rocha.
Seu livro de estreia, Reverdor, saiu em 1965. Em seguida, publicou Fábula Civil (1975); e A Caligrafia do
Soluço & Poesia Anterior (1996). Sua Antologia Poética e Inéditos, de 2017, foi antecedida pelo volume Poesia
Reunida e Inéditos (Escrituras, 2011).
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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