Amigas e amigos,
Antes de tudo, uma observação. Este boletim está circulando com uma semana de atraso. E o motivo foi simplesmente uma atrapalhação calendárica
do editor, que confundiu as semanas “sim” e “não” do boletim. Antecipo, portanto, que — para manter o passo — haverá outro boletim na próxima semana.
•o•
O poeta desta edição já esteve aqui no boletim n. 167,
em junho de 2006. Trata-se do professor de psicologia na UFPB, psicanalista, ficcionista, cronista e poeta Ronaldo Monte. Lamentavelmente,
esta edição, pensada para registrar o lançamento recente de seu livro Manual Prático de Desaparecimento (Patuá, 2018), tornou-se
uma homenagem póstuma ao autor. Ronaldo Monte de Almeida faleceu em agosto passado.
Nascido em Maceió (1947), tornou-se, como dizia, “paraibano por opção e por tempo de serviço”. De fato, vivia na Paraíba há 40 anos, desde
quando se mudou para João Pessoa, a fim de ensinar na UFPB. Na poesia, seu primeiro livro publicado foi Pelo Canto dos Olhos, em 1983.
Em 2000, saiu a coletânea Tecelagem Noturna, volume que também inclui o título de estreia.
Mas o escritor, inquieto, não trafegou somente nos domínios da poesia. Ele também produziu contos, crônicas e publicou o romance
Memória do Fogo (Ed. Objetiva, 2006). Este boletim homenageia o poeta Ronaldo Monte com a transcrição de poemas de seu
Manual Prático de Desaparecimento.
Esse livro divide-se em três blocos de poemas: O primeiro tem o mesmo título do volume. Em seguida vêm “Poemas Maternos” e, por fim,
“Passatempo”. Para quem acompanha o trabalho poético de Ronaldo Monte, não é difícil perceber que, no bloco inicial, ele revisita e
aprofunda temas associados à decadência física e à extinção da vida, já abordados em livros anteriores.
Assim, os poemas da divisão “Manual Prático de Desaparecimento” especulam sobre algum modo de “Preparação para a morte”, como escreveu,
de maneira mais crua, o pernambucano Manuel Bandeira. Não posso afirmar que o poeta teve essa intenção ao reunir os textos desse
“manual”. De todo modo, é o que parece.
•o•
Para esta edição, selecionei seis poemas do livro. O primeiro, “Manual Prático de Desaparecimento”, dá título
à seção inicial da coletânea
e ao próprio livro. O texto aconselha o leitor a experimentar situações estranhas: visitar lugares onde ninguém lhe entenda a língua; passear
pelo deserto com o sol a pino, a fim de não deixar nenhum rastro, nem sombra; e, ainda, ficar sozinho ao anoitecer até se diluir em sombras.
Trata-se, sem dúvida, de treinamentos suaves para encarar a mais estranha de todas as situações — o definitivo desaparecimento.
O poema “Nudez” permanece no mesmo campo temático. Nele o poeta recorre à mitologia grega e atribui a Caronte — o barqueiro da morte — a tarefa
de apagar todos os vestígios deixados na terra por quem partiu.
O texto seguinte, “Mãos Dadas”, pertence a outro capítulo, “Passatempo”. Trata-se de algo mais leve, afinado no diapasão lírico-amoroso. Do mesmo
capítulo e tonalidade lírica é o poema “Fonte”, que trabalha com os mistérios do sono e dos sonhos.
•o•
Em “Segunda Chance”, o poeta se volta para a realidade atual do Oriente Médio. Usa a tradição cristã do Natal, do nascimento de Cristo, e compara
o mortandade praticada por Herodes com os bombardeios israelenses sobre a Faixa de Gaza, na Palestina.
O último poema da seleção, “Herança”, também pertence ao bloco “Passatempo”. Mas, curiosamente, nele o tema retorna ao contexto de “Manual de
Desaparecimento”. O texto se organiza como um metapoema, no qual o autor declara cuidar com carinho das palavras herdadas. Elas são a prova
fundamental de sua “breve passagem pelo mundo”, seu testamento. Palavra do poeta.
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
•o•
Curta o poesia.net no Facebook:
•o•
LANÇAMENTOS
Dois livros de poemas e um de contos entram em circulação
nos próximos dias.
Como Aquela Montanha Sossegada
• Antonio Brasileiro
Tudo no Mínimo - Antologia do Miniconto na Bahia
• Roberval Pereyr e Aleilton Fonseca (orgs.)
A Editora Mondrongo lança dois livros de literatura. O primeiro é Como Aquela Montanha Sossegada,
poemas de Antonio Brasileiro; o outro, Tudo no Mínimo - Antologia do Miniconto na Bahia,
organizado pelos poetas Roberval Pereyr e Aleilton Fonseca.
Quando:
Quinta-feira, 18/10/2018, às 20h30
Onde:
Academia de Letras da Bahia
Av. Joana Angélica, 198 - Nazaré
Salvador, BA
A Casa & Outros Poemas
• Ecléa Bosi
“Se mora alguém nessa pequena casa / e vê o jardim atrás dessa janela / terá sentido o palpitar da asa / do sonho que
esquecemos dentro dela?!” Estes são versos do livro A Casa & Outros Poemas, de Ecléa Bosi (1936-2017), lançado agora pela
Editora Com-Arte e a Lis Gráfica.
Quando:
Quarta-feira, 24/10/2018, das 18 às 20h
Onde:
Livraria João Alexandre Barbosa
Av. Prof. Luciano Gualberto, 78 - Espaço Brasiliana
Cidade Universitária - USP
São Paulo, SP
•o•
TRECHO DE LIVRO
Trecho delicioso do livro O desatino da rapaziada (1992), de Humberto Werneck,
que conta as peripécias de jornalistas e escritores mineiros no período de 1920 a 1970. Entre as figuras que aparecem no livro, lá estão a turma belo-horizontina de
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e Pedro Nava (1903-1984) e também um grupo mais novo, conhecido
como Os Quatro Mineiros: Hélio Pellegrino (1924-1988), Otto Lara Resende (1922-1992),
Paulo Mendes Campos (1922-1991) e Fernando Sabino (1923-2004).
Aí vai o trecho:
No que às vezes tem de doentio, a burocracia deu origem, também,
nas Minas Gerais, a episódios entre o cômico e o trágico. Nenhum deles,
provavelmente, mais expressivo que a morte de João Luís Alves, deputado,
senador, ministro da Justiça e do Supremo Tribunal Federal, membro
da Academia Brasileira de Letras, falecido em Paris em 1925. Quando dele
só se aguardava o suspiro final, eis que Alves emerge da agonia e murmura:
“Já despachei todos os papéis. Chamem o contínuo”.
E exonerou-se deste mundo.
Humberto Werneck, in O desatino da rapaziada (Cia. das Letras, 2ª ed., 2012), pág. 146.
•o•