Amigas e amigos,
Tenho aqui em mãos o novo livro do poeta mineiro Gilberto Nable, Poemas do Desalento & Alguns Elogios, lançado este ano. Conforme sugere o título, a obra
se divide em duas partes principais. Na primeira estão reunidos poemas de produção mais recente. São os versos do desalento.
Na outra parte, mais volumosa, o poeta decidiu elogiar autores de sua predileção, entre os quais poetas como Dantas Mota, Cecília Meireles, Mario Quintana, Nicanor Parra
e filósofos como Nietzsche e Montaigne. Os elogios são vazados às vezes em prosa, às vezes em verso, ou numa combinação das duas formas de expressão.
O livro tem ainda uma terceira parte, menor, chamada “Esparsos”, na qual se encontra nais um punhado de poemas, incluindo alguns de data já distante, como os anos 60 e 70.
São, suponho, textos colhidos no baú do poeta.
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Para este boletim, selecionei quatro poemas, todos pertencentes à porção desalentada do livro. Mas, enquanto escrevia estes comentários, revisitei outras
obras do autor e decidi replicar aqui um poema de Percurso da Ausência (2006).
Inclinado à filosofia — conforme provam seus elogios a pensadores —, Gilberto Nable usa a expressão poética para refletir sobre os desconcertos do mundo.
No poema “Palavras”, ele se põe a indagar sobre a função das palavras — esse atributo fundamental que nos distingue dos
outros animais. “Que luz me ilumina quando falo? / E quando escrevo o que se acende em mim?”
No próximo texto, “Galerias”, a observação do poeta se volta para o convívio da família patriarcal brasileira com as criadas, uma óbvia sobrevivência do escravismo.
O poema traça o paralelo entre “a galeria de figuras notáveis da família” (os patrões) e uma galeria de outro tipo, subterrânea, concedida à criada de uma vida inteira,
da qual não resta nem sequer o nome.
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Em “As Meias Furadas” juntam-se na mente do sujeito lírico memórias domésticas da infância — lembranças manchadas de lágrimas — com os acontecimentos de hoje descritos nos
jornais: “notícias / de um mundo sempre caduco”. A conclusão surge em tom de completo desalento: “Tempo de astrolábios quebrados”.
Ora, o astrolábio era um instrumento náutico antigo usado para determinar a latitude e a longitude do local onde se encontra o observador. Na tecnologia de hoje, seria um aparelho
de GPS que diz ao usuário onde ele está. Se, no poema, os astrolábios estão quebrados, implica dizer que seu dono está completamente perdido. Não sabe onde se
encontra e, por decorrência, também não é capaz de definir aonde vai.
Sempre em tom que tende à elegia, em “Meu Tempo” — que também poderia chamar-se “Minha Hora” —, o poeta medita sobre a morte. Primeiro, a pergunta: “Devo ajoelhar-me e
chorar de medo?”. Mais adiante, faz considerações sobre o que aconteceria post mortem. Cenas triviais: “as coisas voltarão aos seus lugares,/ (...) / as roupas estendidas
nos varais, / a chuva escurecendo pedras na calçada”.
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Vem, por fim, o poema “Ornitorrinco”, que pincei no livro Percurso da Ausência (2006).
Este texto já apareceu aqui no boletim n. 190, mas decidi trazê-lo de volta
para mostrar como a poesia de Gilberto Nable se mantém coerente em torno de certos temas reflexivos.
De saída, o ornitorrinco, figura aparentemente desconjuntada e fora de lugar, é o próprio sujeito lírico. O ambiente é um bar, onde ele bebe
e medita sobre o mundo. Medita, viaja até “o sem-fim do universo” e retorna de lá sentindo-se minúsculo: “Um grão de areia / grudado no milênio”.
O sujeito é despertado de suas elucubrações metafísicas quando o garçom vem perguntar-lhe se quer mais uma cerveja. Afinal, ele está num bar
para beber ou para meditar?
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Gilberto Nable (Aiuruoca-MG, 1954) é médico e já esteve aqui nesta página nas edições n. 362,
de 2016, e n. 190, de 2006. Poeta e contista, estreou em 1988 com o livro
Elegias Urbanas e Outros Poemas. Em seguida, publicou o livro de contos Menino Abstrato (1995). Vieram depois as coletâneas de poemas Percurso da Ausência (2006);
O Mago sem Pombos (2008); O Tratador de Canários (2010);
e Poemas do Desalento & Alguns Elogios (2019).
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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TRADUÇÃO DE POESIA
Dias atrás, recebi um e-mail da poeta e tradutora italiana Manuela Colombo. Ela, que já divulgou na internet milhares de poemas portugueses
e brasileiros vertidos para a língua de Dante, acaba de lançar novo blog, Carmina Lusitana.
Em suas palavras, o blog “brota de uma grande paixão pela poesia e pelos poetas da língua portuguesa”.
Nesse espaço, ainda em montagem, há poemas vertidos para o italiano, pela própria Manuela, e para o francês, por Christian Guernes. O Carmina Lusitana, no momento em
que escrevo, reúne poemas de três brasileiros (Dante Milano, Donizete Galvão e Gilberto Nable) e dois portugueses (Nuno Rocha Morais e Sophia de Mello Breyner Andresen).
Outro site com trabalhos de Manuela Colombo é O Melhor da Web.
Ela atua ainda no Lyrics Translate, no qual chegou a traduzir até poemas deste comentarista. Aqui.
Neste último endereço, Manuela e Christian Guernes contam com a ajuda de Emilia Albo Rosillo (pseudônimo: Sarasvati), francesa
de origem andaluz, que traduz para o espanhol.
Aos três tradutores, nosso agradecimento pela divulgação da poesia de língua portuguesa.
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LANÇAMENTOS
• Nova Antologia Poética
• Uma História do Paraíso & Outros Poemas
Ruy Espinheira Filho
• Cerração
Alexei Bueno
Os poetas Ruy Espinheira Filho e Alexei Bueno lançam três livros no mesmo evento. Dois são do baiano Espinheira, Nova Antologia Poética e
Uma História do Paraíso & Outros Poemas. O terceiro, Cerração, é assinado pelo carioca Bueno. Todos os títulos são publicados pela Editora Patuá.
Quando:
Quinta-feira, 25/07/2019,
a partir das 18h
Onde:
Patuscada Livraria, Bar & Café
Rua Luís Murat, 40
Pinheiros
São Paulo, SP