Amigas e amigos,
Neste 12 de dezembro, o poesia.net completa 17 anos em circulação. Para
mim, é sempre uma satisfação pensar que já estamos juntos há tanto tempo, compartilhando doses quinzenais de poesia.
Este é o último boletim do ano. Em janeiro, como ocorre desde 2002, o poesia.net não circula. Boas festas e feliz 2020 para todos.
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Em dezembro de 2008 — lá se vão onze anos! —, a edição n. 260
do boletim teve como título “Canções de Cecília”. Tratava-se, como este, de um número especial de aniversário. Agora, resolvi repetir a dose,
publicando outras canções de, claro, Cecília Meireles.
Conforme se sabe, Cecília é uma poeta em cuja obra a musicalidade, o ritmo, os versos cantantes se destacam como talvez em nenhum
outro autor da língua portuguesa. Desse modo, o boletim comemora seu aniversário ao som de canções cecilianas.
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Para este número, pincei na poesia completa de Cecília Meireles exata meia dúzia de poemas-canções.
O primeiro já se revela pelo nome:
“Canção do Carreiro”. Neste poema se observam dois andamentos. Nas estrofes ímpares, o primeiro verso é sempre “Dia claro”,
enquanto o segundo traz uma
caracterização do vento: “sereno”, “marinho”, “do monte” etc. O terceiro verso também se repete: “roda, meu carro”
— e segue-se uma observação
sobre o percurso.
Enquanto as estrofes ímpares fazem as vezes de um refrão variável, as pares desenvolvem pensamentos. E, numas e noutras, a musicalidade se
mantém: “Na verdade, o chão tem pedras, / mas o tempo vence tudo. / Com águas e vento quebra-as / em areias de veludo.”
O próximo texto é “Chorinho”, outra canção anunciada pelo título. O final é de uma grande melancolia: “Ai, choro de clarineta!
/ Ai, clarineta de prata! / Ai, noite úmida de lua...”
Vem a seguir o poema “Panorama”. Trata-se de uma dessas cançonetas tristes — na poesia de Cecília, quase
todas têm esse tom
— que parecem ter como objetivo apenas exalar música. “Em cima, é a lua, / no meio, é a nuvem, / embaixo, é o mar”.
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Agora, chega a vez desse magnífico “Encomenda”, que eu não teria medo de incluir entre os mais belos
textos da autora. Mais uma vez, uma
canção de profunda melancolia. Observe-se que o pedido é para o fotógrafo produzir uma foto que finja alegria e na qual a fotografada
vai aparecer “com um vestido de eterna festa”. Esse contraste (alegria simulada versus tristeza real), somado ao sentimento de perda
(cadeira vazia), torna o poema mais sombrio e, ao mesmo tempo, mais rico de susgestões e significados.
Já que falamos em perda, o próximo texto, “Caronte”, é todo sobre isso. Centra-se na maior de todas as perdas, a morte. Caronte, na
mitologia grega, é o barqueiro que faz a travessia do rio Estige, transportando as almas dos recém-falecidos do mundo dos vivos para
o outro lado.
A mulher que fala no poema dirige-se ao barqueiro e se revela uma poeta, uma trovadora, mesmo nesse momento extremo: “Caronte,
juntos agora remaremos: /
eu com a música, tu com os remos”. Não resta dúvida de que é a própria Cecília quem dialoga com o sinistro navegador. Curiosamente,
nesta canção não há uma recusa da morte. Ao contrário: a trovadora entende que está empreendendo a mesma viagem natural já feita por
seus pais, avós e irmãos.
O tratamento dado ao barqueiro é cordial. “Fala-me das coisas que estão por aqui, / das águas, das névoas, dos peixes, de ti”.
E, mais uma vez, consciente de que o artista só tem sua arte, promete pagar ao homem pela travessia. “Pago-te em sonho,
pago-te em cantiga, / pago-te em estrela, em amor de amiga”. No final, confirma a terrível solidão dos mortos e canta uma palavra: “ADEUS!”.
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O último poema da seleção é “Surdina”. Observem como tudo conduz à música. Surdina, diz-nos o Aurélio, é uma peça que se acopla a
diversos instrumentos musicais para abafar-lhes a sonoridade e alterar-lhes o timbre. É também o pedal esquerdo do piano. Portanto,
o título do poema não aparece aí por acaso.
No texto, a música provoca sentimentos difusos: lembranças, saudades. Para fechar com um tom de nostalgia bem à la Paul Verlaine, em meio à
música distante (“vaga música”, como o título de um livro de Cecília), irrompe a chuva. E tudo termina entre nuvens e
“séculos de melancolia”.
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A carioca Cecília Meireles (1901-1964) já esteve outras vezes aqui no poesia.net.
Para saber mais sobre ela e sua poesia, visite os outros boletins em que ela aparece:
• poesia.net 278
• poesia.net 267
• poesia.net 261
• poesia.net 260
• poesia.net 5
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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poesia.net, 17 anos
Visite o painel com todos os poetas publicados pelo boletim em seus 17 anos.
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LANÇAMENTOS
Neste final de ano, muitos novos livros de poesia estão chegando aos leitores. Aqui,
quatro deles: três em São Paulo e um em Salvador.
Rastros
• Tarso de Melo
Após lançar uma poesia reunida em 2014 e Íntimo Desabrigo em 2017, Tarso de Melo produz agora
a antologia Rastros, publicada pela Martelo Casa Editorial.
Poesia +
(Antologia 1985-2019)
• Edimilson de Almeida Pereira
No mesmo evento de Tarso de Melo, o poeta Edimilson de Almeida Pereira
lança Poesia + (Antologia 1985-2019). Os dois escritores autografarão seus livros e
conversarão sobre poesia no local.
Quando:
Quinta-feira, 12/12/2019, às 19h30
Onde:
Tapera Taperá
Av. São Luis, 187
Galeria Metrópole - Loja 29 - 2° andar - Centro
São Paulo, SP
Mulheres Salgadas
• Cecilia Furquim
A poeta Cecília Furquim, que já tem livros para o público
infantil, lança Mulheres Salgadas, seu primeiro título para leitores de mais idade.
Com ilustrações de Lúcia Hiratsuka, a obra sai pela Editora Urutau..
Quando:
Sábado, 14/12/2019, às 18h
Onde:
Tectonica Café
R. Min. Ferreira Alves, 686
Pompeia
São Paulo, SP
Campo de Eros e Outros Poemas de Amor
• Ruy Espinheira Filho
O poeta Ruy Espinheira Filho organiza nova antologia,
desta vez centrada no sentimento amoroso. Trata-se de Campo de Eros e Outros Poemas de Amor, livro publicado pela Editora Caramurê.
Quando:
Segunda-feira, 16/12/2019,
às 18h
Onde:
Estande da Editora Caramurê
Shopping Barra, 2° piso
Salvador, BA
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