Amigas e amigos,
Todos sabemos que o baú poético do lisboeta Fernando Pessoa (1888-1935) rende pano para infinitas mangas. Por isso, retornamos a ele, mais uma vez — a sexta.
Mas não se preocupem: cada Pessoa é outra pessoa.
De fato, em 2003, na edição n. 22, destacam-se apenas os
“outros” Pessoas: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.
Na edição n. 145, dois anos depois, a referência são os
70 anos da morte de Fernando Pessoa, ele mesmo.
No terceiro boletim dedicado ao poeta (ou aos poetas?), a edição n. 250, o título é
“Tenho mais almas que uma”, verso que permite antever o conteúdo.
A seguir, em sua quarta visita, na edição n. 329, de
2015, o destaque vai para alguns poemas do engenheiro Álvaro de Campos, a figura mais inquieta das muitas que habitam o cérebro de Fernando Pessoa.
Por fim, a quinta aparição dele por aqui, na
edição n. 433, de 2019, volta-se para o ajudante de
guarda-livros Bernardo Soares, autor do Livro do Desassossego, uma espécie de diário íntimo escrito em prosa.
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E o que será agora?
Desta vez, pesquei sete poemas do próprio Pessoa nas seções “Poesias Coligidas - Inéditas 1919-1935” e “Novas Poesias Inéditas”, da
Obra Poética publicada pela Nova Aguilar. Os textos em ambas as seções são datados pelo autor. Contudo, somente na primeira os organizadores
da obra atribuíram um número de identificação. O poema que abre a coluna ao lado, por exemplo, é o número “[555]”.
Nesta página, quando havia o número,
usei-o como título do poema. Quando não, o primeiro verso ficou sendo o título. Faço questão de que o poema tenha título.
Fica mais fácil fazer referência a ele, chamando-o por um nome. Caso contrário, é necessário fazer rodeios
do tipo “o poema que começa com a frase X...” ou “o terceiro texto da série”.
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Vamos aos poemas. O primeiro é “[555]”. Aí temos um perfeito exemplo dos textos pessoanos. Primeiro, ele tece uma série de considerações
sobre os deuses. Tais entidades, afirma, “são felizes” e não sofrem reveses da parte do destino. O único problema dos deuses está no
último verso do poema.
O texto seguinte é o “[599]”. Nele o sujeito lírico faz mais um dos inúmeros exercícios de divisão de personalidades que se encontram
na poesia de Pessoa. “Brincava a criança / Com um carro de bois. / Sentiu-se brincando / E disse, eu sou dois!”.
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O poema “[636]” situa-se em registro mais lírico-filosófico. Indaga: “Quem vende a verdade, e a que esquina? / Quem dá a hortelã com
que temperá-la?”. Que gosto terá a verdade temperada com hortelã? — pergunto eu. Não sei. Mas tenho certeza de que, poeticamente,
é uma imagem deliciosa, assim como delicioso é todo este poema.
Fiquei curioso com a referência à “filarmônica de um Barreiro”. Tinha certeza de que se tratava de algo do passado português.
Recorri à poeta lusa Graça Pires, apresentada aqui na edição n. 447.
Ela gentilmente informa: “O Barreiro é uma vila que fica do outro lado do rio Tejo, que nessa altura só podia ser atravessado por barco porque não tinha
sido ainda construída a ponte sobre o rio. Daí a referência ao barco e às gentes, que eram muitas as que faziam esse percurso”. Mas a poeta,
cautelosa, adverte: “Quanto ao significado que Fernando Pessoa quer dar às palavras que escreveu, já não é da minha lavra…”
O próximo poema, “[Se alguém bater à tua porta]”, é mais uma daquelas criações pessoanas que, como se diz, dão nó em pingo d’água. Basta citar os
três primeiros versos: “Se alguém bater um dia à tua porta, / Dizendo que é um emissário meu, / Não acredites, nem que seja eu”.
Somente esta introdução já vale um poema. Deixo aos leitores o restante da trama.
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Vem a seguir o texto “[Tudo, menos o tédio, me faz tédio]”, outra criação estonteante. O contexto, no entanto, é de um amor não correspondido.
O sexto poema, “[Bem sei que todas as mágoas]”, é apenas uma canção triste. Mas uma canção com o timbre de Fernando Pessoa:
“Bem sei que todas as mágoas / São como as mágoas que são / Parecidas com as águas / Que continuamente vão...”.
Chega, enfim, o último poema: “[Sim, está tudo certo]”. Aqui, mais uma vez, o poeta cria situações atordoantes. Basta ler o início:
“Sim, está tudo certo. / Está tudo perfeitamente certo. / O pior é que está tudo errado”.
Neste poema, há um sinal de interrogação [?] correspondente a uma palavra ou expressão a ser preenchida. Trata-se de um texto inacabado.
Mesmo assim é Fernando Pessoa, não há dúvida, cutucando as incoerências do mundo. E, como diz, “excepto estar errado, é assim mesmo,
está certo”.
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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18 ANOS
Conforme indica o cabeçalho desta edição, o poesia.net está próximo a entrar em seu 19° ano de circulação.
De fato, em 12 de dezembro, o boletim completa sua maioridade.
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