Amigas e amigos,
Nesta edição, o poesia.net revisita o trabalho da poeta paulistana Mariana Ianelli, desta vez com uma seleção de textos
de Manuscrito do Fogo (2019), antologia que contém poemas de oito livros da autora. Curiosamente, selecionei para este boletim cinco
poemas que fazem parte do volume Tempo de Voltar (2016), o último publicado antes da antologia.
Poeta de produção regular, Mariana Ianelli escreve uma poesia que se destaca pelo tom reflexivo. Nos poemas de Tempo de Voltar, a autora
empreende uma viagem de retorno (real ou virtual, não importa) a lugares, pessoas e situações de profunda referência simbólica, seja para o indivíduo, seja para a humanidade.
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No primeiro poema da microsseleta ao lado, “Dos Anos de 1940”, surge a figura de Eva Heyman (1931-1944), menina judia húngara que, assim como
sua contemporânea alemã Anne Frank, também escreveu um diário sobre a perseguição nazista aos judeus. Eva e seus avós foram mortos em Auschwitz
em 1944. No poema de Mariana Ianelli, a garota escreve: “Querido diário, tenho tanto medo”.
O texto seguinte, “Interior”, traz uma atmosfera mais amena. O ambiente é bem fluido, subjetivo. Visita-se uma casa marcada pela
antiga presença de pessoas e histórias. Alguns objetos são nomeados — mesa e espelhos —, mas não há referência direta a personagens, exceto
a declaração inicial: “Alguém esteve aqui / já não está”. No final, sabe-se também que “um coração / parou de bater”. Tem-se, portanto,
uma série de pistas e sugestões num quadro traçado com pincéis impregnados de melancolia.
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A viagem “de volta” dirige-se agora para a “Costa Normanda”, título do próximo poema. O olhar se volta para a paisagem marítima com postura idêntica
à de quem visita a casa no poema anterior. As falésias parecem meras ruínas, lugares sem importância. Mas ali há sinais discretos da violência do mar
esculpindo a pedra com o cinzel chamado tempo. Em certo sentido, o tempo é a chave de todas essas peregrinações de retorno.
O próximo poema é “Julho”, um texto marcado pela sazonalidade aparentemente europeia. Há um esparramar de “coisas ocorridas” num verão do hemisfério
norte, coisas que envolvem cores, luzes e perfumes. O ambiente é meio indefinido: é algo para se observar e absorver, com todos os sentidos.
Chega, por fim, o poema “Lugares”. Mais uma vez, o retorno a sítios que já não existem. Lembrar. Voltar a tempos/lugares difusos, indefinidos
— “camas de casa, mercados de Damasco / cidade dourada, templo de Palmira” —, nos quais se deve deixar corpo e alma envolvidos no exercício da
memória. Memória que é também imaginação e ebulição dos sentidos.
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Mariana Ianelli (São Paulo, 1979) é jornalista, poeta, contista e ensaísta. Estreou na poesia em 1999, com o livro Trajetória de Antes.
Publicou em seguida mais oito coletâneas, entre as quais Duas Chagas (2001); Almádena (2007); Tempo de Voltar (2016);
e Canções Meninas (2019). Sua antologia Manuscrito do Fogo (2019) contém poemas de oito títulos anteriores.
A poeta Mariana Ianelli já esteve aqui neste boletim nas edições
n. 449 (2020),
n. 289 (2013) e
n. 282 (2007).
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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