Amigas e amigos,
Nesta quinta-feira, 12 de dezembro, este boletim completa 22 anos, idade bastante avançada para uma publicação digital.
Um brinde ao poesia.net pelo seu aniversário! E viva a poesia!
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Lembrete: este é o último boletim de 2024 com conteúdo poético. Haverá ainda uma edição com a retrospectiva do ano. Em seguida,
o poesia.net entrará no tradicional recesso de verão. Esperamos voltar com mais poesia em fevereiro de 2025. No mais,
um bom fim de ano e um excelente 2025 a todas e todos.
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Em outubro do ano passado, logo após o início do atual massacre em Gaza, publiquei um boletim com poetas palestinos
(poesia.net n. 519). Naquela edição,
citei duas mulheres: Heba Abu Nada, poeta e romancista, e Heba Zagout, pintora,
ambas mortas em bombardeios naquele mês.
Elas estão outra vez aqui. Os poemas foram escritos pela primeira e as ilustrações, mais uma vez, são quadros da segunda.
Ao preparar aquele boletim, eu só conhecia o último poema de Heba Abu Nada. Contudo, mais recentemente, encontrei
na internet outros poemas dela, traduzidos para o inglês por Huda Fakhreddine, professora de Literatura Árabe
na Universidade da Pensilvânia, Estados Unidos.
Comecei então a traduzir, eu mesmo, alguns poemas do inglês. Sei que esse procedimento (tradução de tradução) não é aceitável,
nem recomendável. Mesmo assim, decidi assumi-lo, impressionado com os versos da jovem palestina. Torço para que alguém logo
traduza para o português, diretamente do árabe, poemas de Heba Abu Nada.
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Mas vamos aos textos. Em “Não Apenas Passantes”, ocorre o diálogo de uma estrela com a pequena luz existente no coração da pessoa
que fala no poema. Certamente, diante do contexto de duríssimas adversidades, a luzinha titubeia e pensa em se apagar. A estrela
insiste para que permaneça firme.
No final, o próprio narrador passa a encorajar sua luzinha interna: “Ó pequena luz em mim, não morra, / mesmo que todas
as galáxias do mundo / se aproximem”. Em suma, não estamos aqui apenas de passagem. Temos uma tarefa a cumprir: vamos cumpri-la.
O próximo poema é “Recomponha-se”. Trata-se de um discurso dirigido a Darwish — Mahmoud Darwish (1941-2008), considerado o poeta
nacional da Palestina. É o autor da “Declaração de Independência Palestina”, escrita em 1988, e lida pelo líder Iasser Arafat
quando declarou unilateralmente a criação do Estado Palestino.
No poema, Heba Abu Nada repete várias vezes o lamento “Oh como estamos sozinhos!”, referindo-se ao minguado apoio oferecido
por outras nações aos palestinos. Afinal, argumenta, no mercado aberto que é a Terra, os grandes países se venderam.
O eu poético dirige-se a Darwish: “A poesia não devolverá aos solitários / o que foi perdido, o que / foi roubado”. Em outras
palavras, os palestinos têm sido destroçados na guerra e a poesia não tem força para mudar isso. No final, sobra um pito para
a própria Palestina: “recomponha-se”. Ou seja, procure um jeito de sair desta situação.
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“Sete Céus para a Pátria” é o próximo poema. Aí está um texto que dói. Expressa o sentimento palestino de quem se sente
abandonado no próprio país. Uma pátria que “corre em nossas veias” e trabalha “nos bosques da tristeza”. O final é terrível:
“É como se fôssemos escândalos, nossa saudade um crime, / e o amor ao nosso país um pecado”.
Vem a seguir o poema “Eu Lhe Concedo Abrigo”. Aqui, o tema são os bombardeios israelenses. Escrito em 10 de
outubro de 2023, o texto, em cinco partes, mostra bem a preocupação das pessoas aterrorizadas sob a chuva de bombas.
O poema vai desde quando o míssil é ainda “a ordem de um general” até quando cai sobre casas e mesquitas — e “as lágrimas
das mães agora são pombas”, “arrastando-se atrás / de cada esquife”. Triste, triste, triste.
Vem, por fim, “O Último Poema”, escrito pela poeta na véspera do bombardeio em que ela própria sucumbiu. “A noite na
cidade é escura / exceto pelo brilho dos mísseis;/ (...) / tenebrosa, exceto pela luz dos mártires”.
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Heba Abu Nada (1991-2023) nasceu em Meca, na Arábia Saudita. Estudou bioquímica na Universidade Islâmica de
Gaza e fez o mestrado em Nutrição Química. Poeta e prosadora, em 2017 publicou o romance Oxygen is Not for the Dead
(O oxigênio não é para os mortos). A escritora foi morta aos 32 anos, durante um bombardeio em Khan Yunis, no sul da
Faixa de Gaza, em 20 de outubro de 2023.
Agora, mais de um ano após a morte de Heba, a situação, que já era desesperadora no início do conflito, tornou-se
“terrível e apocalíptica” — palavras usadas por António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, em comunicado
no dia 2 deste mês.
Uma carta assinada por diversas organizações da ONU alerta para o fato de que “toda a população palestina no norte
de Gaza está em risco iminente de morrer de doenças, fome e violência”. Segundo autoridades médicas de Gaza, mais
de 45 mil pessoas já foram mortas e 105 mil ficaram feridas, desde outubro de
2023.
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
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