Amigas e amigos,
O poeta Iacyr Anderson Freitas (Patrocínio do Muriaé-MG, 1963) lançou seu primeiro livro de poesia, Verso e Palavra,
em 1982. Completa agora, portanto, 40 anos de trajeto literário. E, para comemorar, traz a público nova coletânea de poemas:
Os Campos Calcinados (Faria e Silva, 2022).
Neste livro, a poesia do autor exibe múltiplas facetas, com ampla diversidade de temas. Aqui no boletim, no entanto, quero focar em
alguns aspectos que, a meu ver, ganham agora maior destaque no trabalho de Iacyr. São aspectos que refletem a idade do poeta,
que este ano completa 59 setembros. Com quase seis décadas de vida, o indivíduo começa a meditar sobre temas com os quais naturalmente
não se inquietava quando, ainda adolescente, publicou seu primeiro livro.
•o•
Um desses temas é a morte. A indesejada das gentes aparece em vários textos do livro. Está subentendida, por exemplo,
no poemeto “Quem, afinal”. Aí os dias são comparados a “aves de arribação”. A ideia da finitude da vida também surge
em outro poema curto, “Desconvite”. O sujeito lírico, desapontado, lamenta: “outrora eu brindava às musas/ estão
cheios os odres dizia/ e elas nunca vinham”. Agora, em sentido contrário, ele brinda a Tânatos, o deus da morte,
para que não venha. Faz a ele o “desconvite” do título, mas sabe que, com certeza, ele não deixará de vir.
Tânatos também dá o ar de sua falta de graça no poema “Véspera de Natal, a débito”.
Igualmente compacto, este
poema trata da perda dos integrantes mais velhos da família. E surge a preocupação: quem será o próximo? Essa indagação
nos remete ao aniversário no qual o heterônimo pessoano Álvaro de Campos relembra a infância e deplora: “No tempo em
que festejavam o dia dos meus anos,/ Eu era feliz e ninguém estava morto”.
As recordações de infância são outro tema que ressalta na nova coletânea de Iacyr Anderson Freitas. Elas aparecem,
por exemplo, em “Últimos acordes”. O narrador se propõe a voltar à cidade dos primeiros anos de vida, reencontrar
as pessoas do passado e até a banda de música no coreto. Conclui, no entanto que é algo magoadamente inútil: “voltar em vão/
aonde todos fugiram”.
•o•
As inflexões líricas voltadas para o tempo que passou não impedem o poeta de observar o presente. Aqui no boletim
(edição n. 420)
já tive a oportunidade de publicar o poema “Vale quanto lesa”, escrito por Iacyr
Anderson Freitas logo após a catástrofe de Brumadinho. Esse poema, não
transcrito aqui, integra agora Os Campos Calcinados.
Mas há no livro dos 40 anos de poesia outros exemplos dessa antena voltada para a realidade. Um é “Maria Mina”, serviçal que
executa todos os trabalhos da casa. A família dos patrões só percebe a importância de Maria Mina depois que ela morre e, entre outros
incômodos, “o peso do pó” se instala sobre a mobília.
Conforme se vê, no caso de Maria Mina também surge o dedo de Tânatos. O mesmo acontece no poema “Eufemismo: Rio, 1973”.
O contexto aí é a barra pesada da ditadura militar. O “eufemismo” do título consiste em dizer que o opositor
é um “fugitivo”. Na verdade, uma pessoa que já foi assassinada nos porões da tortura.
O poeta também se mostra atento para os termos criados em tempos bem recentes, como “Pós-verdade”. Aí está outro eufemismo.
A rigor — e isso fica demonstrado no poema —, a pós-verdade é apenas uma mentira, temperada com boas doses de cinismo. Por fim,
ao autor também não falta a capacidade de rir e ironizar. Ria você também, lendo o poema “Paraíso Novo da Lapinha”.
•o•
O mineiro Iacyr Anderson Freitas é engenheiro civil e mestre em teoria da literatura pela Universidade Federal
de Juiz de Fora, cidade onde reside. Suas coletâneas poéticas mais recentes são: Os Campos Calcinados (2022);
Estação das Clínicas (2016); e Ar de Arestas (2013). Além de quase três dezenas de títulos de poesia,
o autor publicou livros de ficção e ensaios, e tem ainda numerosas participações em antologias. Além desta edição,
Iacyr Anderson Freitas já figurou aqui no poesia.net em três outras:
n. 420;
n. 373;
e n. 29.
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
•o•
Curta o poesia.net no Facebook:
•o•
Compartilhe o poesia.net
Compartilhe o boletim nas redes Facebook, Twitter e WhatsApp. Basta clicar nos botões logo acima da foto do poeta.