CAMÕES,
TRAÍDO PELA RIMA
Os
cariocas, como sabemos, incluem em certas palavras um fonema i que não existe. É
o caso de "nascer", que muitos deles pronunciam "naiscer"; ou de "mesmo",
transformado em "meismo".
Essa prosódia descende diretamente do português de Portugal. Ouçam bem o
lisboeta falando "Cascais". Até aí, nenhuma novidade.
Mas agora passei a desconfiar que a pronúncia luso-carioca vem desde tempos
camonianos — ou seja, desde os primeiros anos da Terra de Santa Cruz.
Confiram a rima perpetrada pelo vate Luís Vaz de Camões nos segundos versos dos
dois tercetos no soneto abaixo (destaques em verde). Não há dúvida: Camões era carioca!
POR QUE QUEREIS, SENHORA,
QUE OFEREÇA
Por que quereis, Senhora, que ofereça
A vida a tanto mal como padeço?
Se vos nasce do pouco que mereço,
Bem por nascer está quem vos mereça.
Sabei que, enfim, por muito que vos peça,
Que posso merecer quanto vos peço;
Que não consente Amor que em baixo preço
Tão alto pensamento se conheça.
Assim que a paga igual de minhas dores
Com nada se restaura; mas deveis-ma,
Por ser capaz de tantos desfavores.
E se o valor de vossos servidores
Houver de ser igual convosco
mesma,
Vós só convosco mesma andai d'amores.
(Incluído em 14/08/2005)
O MESTRESSALA
Está no forno novo livro do poeta
mineiro Edimilson de Almeida Pereira. Trata-se de O Mestressala. A
primeira parte do livro, um poema longo com o título "Enredo", está disponível
no site da revista Ciência e Cultura, da SBPC. Edimilson, nascido em Juiz
de Fora, tem obra poética de alto nível já publicada. Seu trabalho foi objeto do
boletim poesia.net n. 114.
Para ler a parte inicial de O Mestressala,
clique aqui.
(Incluído em 14/07/2005)
A CHUVA NOS RUÍDOS
A poeta paulista Vera Lúcia de
Oliveira recebe este mês o prêmio de melhor livro do ano de 2004, concedido pela
Academia Brasileira de Letras. O volume destacado é A Chuva nos Ruídos,
antologia publicada pela Editora Iluminuras, de São Paulo. O volume inclui
poemas de cinco livros de Vera Lúcia: Pássaros Convulsos, Tempo de
Doer, Pedaços, Geografia de Sombra e A Porta Range no Fim
do Corredor, títulos citados do último para o primeiro.
Vera Lúcia de Oliveira é uma escritora brasileira com uma história singular.
Residente na Itália, ela escreve de forma bilíngüe, e também conquistou vários
prêmios de poesia em idioma italiano. Portanto, Vera tornou-se também uma poeta
italiana. Na antologia premiada pela ABL está o seguinte poema:
PÁSSAROS CONVULSOS
ave em carne viva
ave em tumulto
ave no osso
ave no uso
asa gravada
no sangue
ave na pressa
ave em vôo convulso
pronta
pra qualquer
fresta
ave torta
e ávida
em revoada
provisória
Vera Lúcia de Oliveira
- A Chuva nos Ruídos
Escrituras Editora
São Paulo, 2004 |
(Incluído em 14/07/2005)
ELES
CANTAM O TEXTO DOS POETAS
O Música
Surda é um quarteto carioca de voz, violão e canções — todas compostas pelos
próprios integrantes do grupo. As músicas são excelentes, idem para a voz e o
instrumental. Um detalhe marcante está nas letras, que são textos de grandes
poetas: Camões, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Federico García
Lorca. O nome do grupo vem de um dos poemas musicados, escrito pelo carioca
Dante Milano (1899-1991).
Aliás, a canção "Música Surda" foi o chamariz que me levou ao site do grupo (www.letras.ufrj.br/musicasurda).
Lá você pode ouvir as canções e ler os poemas. Outro ponto que destaca o
quarteto é sua determinação em fazer música de qualidade, sem prestar vassalagem
aos ditames da moda e às exigências do mercado.
O Música Surda é formado por Andréia Pedroso (voz), Antonio Jardim (violão de 6
cordas, requinto e violoncelo), Celso Ramalho (violão requinto e de 6 cordas) e
Eduardo Gatto (violão de 8 cordas). Sucesso ao Música Surda.
(Incluído em 24/04/2005)
PALESTRAS MARCAM O ANO DA FÍSICA
Eu sempre achei que física e matemática avançadas têm tudo a ver com poesia.
Tanto que mostrei, no boletim
poesia.net n.
70, dois versos de Emily Dickinson que antecipam, poeticamente, o enunciado
do Princípio da Incerteza, de Werner Heisenberg.
Portanto, poetas, seresteiros, namorados, correi: este é o Ano Mundial da Física
e coincide com o centésimo ano da Teoria da Relatividade, publicada por Albert
Einstein em 1905. Por isso, o Instituto de Física da USP está promovendo uma
série de palestras para o público em geral sobre temas fundamentais da física
moderna: relatividade, teoria quântica, nanociência, cosmologia.
As aulas, realizadas em São Paulo, vão de 02 de abril a 10 de novembro, cada uma
repetida em três locais: Estação Ciência, Museu Paulista e Centro Universitário
Maria Antonia.
(Incluído em 06/04/2005)
O "CINEMA" DE RICARDO ALEIXO
Como quem tivesse uma câmera na mão e palavras na cabeça, o poeta Ricardo Aleixo
captou essa bela seqüência de imagens do menino Exu felino no poema "Cine-Olho".
Uma pequena jóia de contenção, força e comunicação.
CINE-OLHO
Ricardo Aleixo
Um
menino
não.
Era
mais
um
felino
um
Exu
afelinado
chispando
entre
os
carros
—
um
ponto
riscado
a
laser
na
noite
de
rua
cheia
—
ali
para
os
lados
do
Mercado.
(Incluído em 27/03/2005)
IARARANA 10
Publicada desde 1998, a Iararana, revista baiana de arte, crítica e
literatura, chega agora ao seu número 10. A edição põe em destaque uma
entrevista com o escritor Guido Guerra, autor do romance Lili
Passeata. A seção de poesia traz trabalhos de nomes conhecidos como Foed
Castro Chamma, Vera Lúcia de Oliveira e Floriano Martins. A Iararana é
editada por Aleilton Fonseca, Carlos Ribeiro e José Inácio Vieira de Melo.
Iararana
— Revista de arte, crítica e literatura
Número 10 — dezembro 2004
Rua Rubem Berta, 267/402 — Pituba
41820-040 — Salvador, BA |
(Incluído em 30/01/2005)
ESTRÉIA A REVISTA JANDIRA
"O mundo começava nos seios de Jandira". Este é o lema da novíssima revista de
literatura Jandira, que herda o nome do poema de Murilo Mendes e tem sede
na cidade natal do poeta, Juiz de Fora, MG. Além de um visual gráfico caprichado,
a revista traz em seu número de estréia uma suculenta seleção de poesia,
prosa e ensaio contemporâneos. Tudo novo, cheirando a século XXI e, ao mesmo
tempo, com um pé bem firme na boa tradição literária.
Logo nas primeiras páginas, Jandira oferece uma entrevista com o poeta
maranhense Ferreira Gullar. Em seguida, vem a seção de poesia, com textos de
outros poetas. Depois, vem o bloco dedicado à prosa, seguida dos ensaios. Vêm,
por fim, um fragmento inédito da poeta e ficcionista paulista Hilda Hilst,
desaparecida em janeiro deste ano, e nova seção de poesia, esta dedicada a
traduções de poesia italiana.
Jandira é uma boa notícia para todos os que apreciam a literatura e se
interessam pela sua difusão. Editada pelo poeta
Ricardo Rizzo, também de Juiz de
Fora, a revista faz jus ao seu patrono e homenageado, Murilo Mendes.
Jandira - Revista de
literatura
Número 1- Primavera de 2004
Funalfa Edições, Juiz de Fora, MG |
(Incluído em 18/10/2004)
AMÁLGAMA, A POESIA DE ROBERVAL
O poeta baiano Roberval
Pereyr acaba de lançar Amálgama - Nas Praias do Avesso e Poesia Anterior,
volume que reúne seis livros, quase todo o seu trabalho poético. Dono de um
lirismo sensível e musical, Pereyr revela-se um mestre na construção de canções.
Vejam este exemplo:
CANÇÃO - 1
Meu barco sou eu sem barco
no mar das dúbias viagens.
Nas noites em que não parto
enfrento monstros às margens
de mim
prostrado no escuro.
Mas amanheço, não tardo
ao lado desta voragem
(tremor do
ser, fria imagem)
que os deuses infelizardos
escavam nos homens puros.
(De Saguão de Mitos, 1998)
Roberval Pereyr - Amálgama
Secretaria de Cultura e Turismo/Fundação Cultural do Estado da Bahia.
Salvador, 2004. |
(Incluído em 10/09/2004)